13 de novembro de 2007

The past recedes

Cada vez mais me convenço que um bom filme é o que se aproxima do ato artístico de abrir para muitos sentidos. Saí do cinema ontem depois de ver o último filme do Babenco com algumas impressões, algumas dúvidas, mas certamente com algum peso.
A trama é dramática, bem ao estilo argentino, e mescla boas doses de loucura e neurose, evidenciando que a linha entre elas é tênue, pricipalmente quando se trata de amor. Frase que seria clichê se estivesse jogada nesse post, e não posta desta forma a partir do filme assistido - ele realmente nos leva para o meio desse processo.
Me surpreendi com algumas coisas que diz o diretor que li em uns sites (http://g1.globo.com/Noticias/Cinema/0,,MUL152207-7086,00.html
http://www.tribuna.inf.br/anteriores/2006/julho/05/bis.asp?bis=cultura01), porque de certa forma ele romantiza uma história que, para mim, é triste. Tudo bem que a tristeza pode ser bela, mas essa possibilidade me sai mais fácil quando não é a tristeza limitante, abafada, reducionista que vai, volta e permeia as vidas dos personagens do filme.
Babenco julga ser o filme mais bem acabado de sua carreira - paradoxo irônico, já que o plot é justo uma relação que doentiamente parece não ter fim - e no entanto notam-se muitos furos, cenas que ficam meio sem sentido (ao contrário de outras, que abrem vários caminhos possíveis).
Irresistível fazer uma análise com a ajuda da psicanálise ou, em outras palavras, com a ajuda da clínica que tome a repetição e a diferença como motes operacionais. É sutil como vai-se expondo a nudez das mulheres e o resguardo esquivo do praticamente único personagem homem da história. Modos completamente diferentes (quase opostos, entre os gêneros; e muito diversificados na tendência à exposição, entre as mulheres), mas que conduzem sempre ao mesmo caminho de sintoma, repetição do mesmo, aprisionamento. Repare que Rimini (personagem de Gael) é vítima e autor de vários atos falhos (alguns nem tão falhos assim) que o mantêm nesse funcionamento. Talvez a que se abrisse à emergência do novo fosse a personagem Carmen, mas a ela também, lá pelas tantas, coube uma atitude fechada ao inesperado do paradoxo.
Portanto, difícil conceber como uma "bonita" história de amor que compreende uma separação. Tá mais pra feia (sem o mal-entendido de um filme feio). A frase do filme e do diretor "as pessoas não se separam: as pessoas se abandonam", cola esse trágico fechado em si mesmo aos finais de relacionamento. Melhor seria dizer que elas não se abandonam, mas sim permanecem umas nas outras, de outras formas. Nossa dificuldade é ser egoísta com nossas próprias vidas em relação a um encontro que acontece em certo momento - que pode ter prazo de validade até o final de uma vida ou no final de dois meses. Temos medo (ainda que às vezes imperceptível) de vir a ser outros, de compor o que fomos com o que podemos devir. E, para isso, há de se apostar nos encontros que possam ser alegres e saber dançar com os que já deixaram de ser.
Se eu fosse o Babenco, espalharia que quis mesmo mostrar uma feiúra que está por aí, que captura ao mesmo tempo em que capturamos. O filme é bom por causa disso.
E nunca é demais um pouco de Nietzsche para ver na história algo a impulsionar o inédito presente - ao invés de chafurdar no ressentir. Devinhemos, para que o retorno seja ritornelo, e não de um mesmo que faz sofrer.

Um comentário:

carol de marchi disse...

tuchê da psi-có-loga!!
tchááááá.