9 de abril de 2009

Ela







Eu caminhava na Nossa Senhora de Copacabana, despretensiosamente, quando Ela apareceu.

Saiu de um edifício, de uma padaria, de um Mate-alguma-coisa, não sei. A lo mejor Ela simplesmente surgiu na calçada. Não me surpreenderia.
Fiquei a dois passos d´Ela, o que me permitia experimentar uma condição de câmera, destas que ficam logo atrás do personagem principal do filme (como em O Lutador). Ela não me via, mas eu via tudo o que ela via. E, principalmente, tudo - e todos - que viam Ela.
Nesse dia eu estava completamente apagada, nos meus 1,54m de altura, enfiada em uma calça de viscolycra preta, chinelas Hanavianas e camisetinha da Smurfete drogada (daquelas que se vê um zilhão iguais nas feirinhas de moda alternativas). Óculos escuros, uma bolsa enorme pendurada em um ombro e sacolão de plástico pedurado na outra mão, caminhava dramaticamente gripada, escabelada, atrasada e desbotada. Sim, uma brancura não dessas delicadas e bonitas, do século XVII, mas de uma mistura européia e de várias raças depois de um bronze de verão e recém entrada no outono.

Ela era negra retinta. Uma cor maravilhosa erguida em longas pernas musculosas, feito duas berinjelas bem desenhadas. Saíam redondas e lisas de um microshort jeans bem clarinho de extremo bom gosto. Vestia blusa branca sem mangas. Não é que tivesse um largo quadril violão emordurando sua bunda exasperadamente redonda, mas seu rebolado dicretíssimo dava a impressão de que tivesse. O cabelo ela levava preso displicentemente bem alto, os cachos pequeninos e descoloridos balançavam como molinhas. Não levava bolsa. Parecia ir comprar cigarros ou um pacote de biscoitos. Havia algo, no entanto, que a deixava muito elegante. Não sei se eram as argolas douradas ou o óculos escuros enormes, mas ela parecia dessas gringas de clipe de rap. E eu, naqueles dias em que o teu príncipe encantado não pode, de jeito nenhum, resolver aparecer. Ainda que o meu príncipe já estivesse em casa. Mesmo assim.

Da minha posição privilegiada, eu via tudo. Os homens a torcer seus pescoços. As mulheres a se espantar.
Existem dois tipos de mulher bonita, na minha opinião. O primeiro grupo é o das interessantes, as gatinhas, as que são olhadas, sim, mas o mundo segue seu rumo. Eu talvez faça parte desse grupo, nos dias em que não estou amarela nem enfiada em calças pretas de viscolycra. Gostosinhas, pitéuzinhos, graciosas, femininas, enfim, são os pontos aos quais podem chegar. Homens olharão, dirão algo. Algumas mulheres darão aquele olhar de cima a baixo, algumas um pouco inibidas, mas repararão. Desse tipo tem muitas, ainda mais no Brasil, ainda mais no Rio de Janeiro.
No entanto, tem uma outra categoria, e essa é para poucas. Muito poucas. Estas são as bonitas de parar o trânsito. Literalmente. São as que paralisam geral. São aquelas que metem medo, de tão avassaladora beleza. E isso, inevitavelmente, tem a ver com a altura. Elas geralmente são altas, pois é preciso se destacar das demais. Elas são sérias: jamais se verá uma dessas mulheres se rindo toda. Para essa, nem todo homem terá coragem de olhar. Alguns não passam do rosto. Escondem um medo sinistro de virar e olhar a sua bunda, como se ela própria tivesse olhos nas costas e os castigasse se isso acontecesse. Para estas, todas as mulheres olharão. Sem exceção. Simplesmente por serem a beleza mais unânime transitando pela rua.
E essa mulher era uma bonita de parar o trânsito.
Por isso, os homens hesitavam em olhar e, tanto eles quanto elas, semi abriam suas bocas quando a avistavam. Eram cenas realmente impressionantes. E eu, assistindo de camarote.

Mais uma quadra e tive que rapidamente avançar à frente d´Ela. Queria chegar inteira ao meu destino.

(Nunca mais saio com minha camisetinha da Smurfete.)









2 comentários:

carol de marchi disse...

um dos melhores posts dos últimos tempos.

Donnassolo Beschi disse...

adorei!