Frio de cortar.Fio pra cortar.Fura feito faca, faz fiiiiiiiie dá um ventinho feio.Frio era ele, forte,firme,fincando a agulha para o fluído a dor evitar.Qual!Fazia doer o não falar.Nas paredes puramente brancas, fixei o olhar.Fácil, foi quase dormir.Palavra na ponta da língua,dormente.Finalmentepude enxergarque justo ali na frentetinha uma cruze até mesmo eu, nem santa nem crente,podia, quem sabe, rezar.Hoje fui no dentista mais uma vez. Tenho tudo que uma pessoa pode ter de problemas com dentes. Tudo bem, pensei, pelo menos não tenho crises de pânico nem músculos mal formados. Que fichinha essa de ter cárie! A risadinha interna se esgotou em seu cinismo quando ele me disse É, tem mais seis restaurações pra fazer.
Me desorganizo em dentistas, já mencionei antes. Sou o clichê das tiras de jornais. Não entendo quem tem medo de psicólogo.
Mas como um dentista é cheio de virtudes! O mesmo sujeito que me cravou de anestésico e apoiou seu pé na cadeira pra arrancar, entre discretos esguichos de sangue, depois de serrar em quatro o meu ciso, estava ali agora esculpindo com broca e resina as cavidades dos meus molares, numa demonstração de exímia motricidade fina e perfeccionismo. Impressionante. Eu não tinha medo dele antes de extrair meus cisos. Hoje não só o respeito, mas também sou fiasquenta.
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Depois de tentar me distrair daquele robô que te aponta a luz pra boca, olhando prum parafuso por vários minutos, reparei na janela e no céu azul. Pra completar meu papel em crônica do Luis Fernando Veríssimo, notei a igreja, único prédio visível pela janela. Olhei sua ponta aguda, cinza, e a cruz fincada no alto. Quase rezei. Mas não. Aquilo ali me lembrava demais uma broca.
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